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Construtechs vieram e mudaram o mercado da construção

6 de março de 2020

Há quase três anos atrás escrevi o artigo "As construtechs estão vindo para mudar o mercado de construção" um momento onde o setor encontrava-se em meio a maior de suas crises, um burburinho em torno das startups começava a ganhar força no mercado, o ecossistema de empreendedorismo brasileiro ainda não tinha seus tão esperados unicórnios.

O tempo passou, e muita coisa aconteceu nesse período. Assim como as startups, a escalada do tema inovação no setor se deu de forma exponencial. E hoje reafirmo que as construtechs VIERAM e MUDARAM o mercado de construção. Por isso faço uma reedição do meu artigo.

Meu ingresso no ecossistema

Em 2016 comecei uma jornada em busca de startups que estivessem focando em atacar grandes problemas do setor de construção, eis que tive a primeira surpresa.

Diferente de setores como educação, saúde, financeiro, o mercado construtivo apesar de representar 10% do PIB global, chamava pouca atenção dos empreendedores que buscavam iniciar uma startup.

Na ocasião, mediante as bases de dados disponíveis entendemos que apenas 3% das startups brasileiras podiam ser consideradas Construtechs (ou hoje Proptechs como se acostumou a nomear).

De acordo com a Associação Brasileira de Startups, o Brasil conta atualmente com 12 mil startups, e pelos mapeamentos feitos pelo nosso time da TerracottaVentures podemos afirmar que ao menos 600 delas inovam na cadeia da construção e setor imobilário. Ou seja, hoje 5% das startups no país estão mirando necessidades reais do segmento, um salto incrível em apenas dois anos.

5% das startups no Brasil podem ser consideradas Construtechs ou Proptechs, um forte crescimento em relação ao que era visto em 2017, um sinal de como o cenário de inovação nesse mercado vem se consolidando"

As razões para o setor estar atrasado em inovação são evidentes

Um dos motivos que acreditamos para existência desse fenômeno se deve a característica do setor de construção.

De acordo com publicação da Harvard Business Review no artigo “Which Industries Are the Most Digital (and Why)?”o segmento de construção aparece como o segundo pior em termos de adoção de tecnologias digitais em seus processos de negócio.

Apenas o segmento de mineração (mining) e imobiliário (real estate) aparecem melhor posicionados. O primeiro em função da necessidade de maquinas equipamentos para realização de sua atividade fim, o segundo fruto da ascensão dos portais imobiliários, que surgiram em todo o mundo na última década, explorando as oportunidades trazidas pelo crescimento e democratização do acesso a internet.

Um setor que naturalmente pouco demanda tecnologia, naturalmente tem menos profissionais envolvidos com negócios digitais, abordando o setor. Ao mesmo tempo, os profissionais que atuam nessa cadeia, e muitas vezes conhecem a fundo as características do negócio, não tem pleno conhecimento das possibilidades que a transformação digital poderia agregar ao negócio.

A combinação desses dois fatores seguramente explica, ao menos em parte, a escassez de casos de startups bem sucedidas em explorar o mercado de construção.

O cenário mudou

Os fundamentos que explicam os desafios e lentidão do setor em inovar são conhecidos e naturalmente não mudam de uma hora para outra. Mas o que temos convicção que mudou foi a atitude de profissionais e empresas desse mercado.

Ao longo de 2019 mapeamos na TerracottaVentures mais de 100 iniciativas relacionadas a inovação no setor da construção e mercado imobiliário nos mais variados formatos. Eventos, aceleração, comunidades, challenges, etc.

Eventos se propagaram por todo Brasil, desde grandes conferências como o Construtech Conference em São Paulo reunindo 3 mil pessoas em busca de inovação no segmento, até eventos regionais muito bem sucedidos como o FastBuilt em Blumaneau em meio a tradicional Oktoberfest; além dos pequenos meetups abordando temas bastante específicos dentro da cadeia organizado por pessoas em diferentes cidades do país.

Grandes empresas passaram a investir em startups, seguindo uma curva natural de evolução de maturidade na relação entre as mesmas e o ecossistema empreendedor.

O número de startups saltou de 250 no ano em que escrevi o referido artigo, para mais de 600 empresas ativas em 2019. Não a toa dois unicórnios foram reconhecidos no Brasil buscando inovar no segmento: Loft e Quinto Andar.

Empresas tradicionais do setor como Cyrela, Zap, Duratex, Brasil Brokers, Tigre, Gerdau, Alphaville, Softplan, se uniram para fomentar ainda mais o ecossistema de empreendedorismo, apoiando o MITHUB, comunidade de inovação nesse mercado.

Investidores anjo aumentaram as apostas em startups do segmento, grupos como o Construtech Angels se formaram para se dedicar inteiramente a essa tese.

Para alguns pode parecer surpresa mas para mim estamos vivendo um comportamento normal esperado em todo ciclo de mudança.

Momento de cruzar o abismo

Os startupeiros que fizeram seu dever de casa conhecem o conceito propagado por Geoofrey Moore. A ideia é entender que um processo de inovação vai se desenvolvendo e ganhando a adoção de mais pessoas em etapas. O autor dividiu as pessoas em cinco grupos:

  • Inovadores
  • Early Adopters
  • Early Majority
  • Late Majority
  • Retardatários

Todo processo de inovação começa a ganhar corpo por meio do primeiro grupo, aqueles inovadores que acreditam em ideias que parecem malucas, se jogam em projetos repletos de incertezas, apontam para direções que muitos desacreditam. Quando bem sucedidos começam a atrair a atenção do segundo grupo, os early adopters são os primeiros a também acreditar que aquela inovação tem potencial para dar certo.

Contudo, esses dois grupos representam uma pequena minoria das pessoas, menos de 15% da população no geral. O desafio é como cruzar o "chasm" e conquistar uma maior fatia da população.

Pois bem, ao meu ver estamos exatamente nesse ponto quando falamos de inovação no segmento de construção e setor imobiliário. Vivemos um momento onde todos os grandes players não mais ignoram o tema inovação, em maior ou menor grau o assunto tem o envolvimento da alta diretoria da empresa.

Ver a MRV afirmando que é uma Construtech, é um ótimo sinal de que estamos vivendo um novo contexto.

Do lado das startups, começamos a ter referencias de empresas vindas de uma nova economia e novo jeito de trabalhar, conquistando fatias de mercado cada vez mais expressivas e servindo de inspiração para milhares de profissionais e empreendedores do mercado.

2020 pode ser o ano de cruzar esse abismo, e tornar a transformação digital no setor assunto orgânico. Acredito que aos poucos vamos deixar de ir a um evento para falar de inovação no setor, vamos apenas ir a um evento para falar do setor e inovação já será naturalmente uma pauta presente nas conversas.

Para cruzar esse abismo, precisamos quebrar silos, desmistificar, educar as pessoas, e passar a ter a inovação sendo pensada não por áreas cuja essa é sua atribuição, mas sim passar a ter inovação como competência esperada no novo jeito de trabalhar de qualquer colaborador, de qualquer empresa, seja ela tradicional ou startup.

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