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Construção Modular no Brasil: veja tudo sobre esse método

14 de fevereiro de 2023

Uma imagem que ficou marcada durante a crise sanitária que estamos passando foi a entrega do Hospital Municipal M’Boi Mirim na zona sul de São Paulo. Construído em apenas 36 dias, através de módulos metálicos, o projeto é a construção hospitalar mais rápida do país.

Fachada do anexo construído no Hospital Municipal M'Boi Mirim - Marcelo Pereira/Secom

O case destaca algumas das principais vantagens da construção industrializada, podendo pavimentar o caminho para questionarmos os sistemas construtivos tradicionais. Mas será que essa metodologia vai dar certo no Brasil?

E o que é construção industrializada?

A construção industrializada ou offsite se refere a estruturas construídas em um local diferente daquele de uso final. Nesse processo, diferentes componentes, estruturas ou módulos são manufaturados e depois transportados para o canteiro, onde é realizada a montagem.

Reinventing Construction: A route to higher productivity - McKinsey Report

De acordo com um estudo da McKinsey, essa metodologia tem o potencial para entregar ganhos de produtividade na ordem de 5 a 10x. Nesse artigo, procuro expor as principais vantagens desse sistema e qual o cenário que encontramos no Brasil para a adoção dessa tecnologia.

Quais as vantagens da construção offsite?

Diminuição do prazo de obra: uma das grandes vantagens é a velocidade. Ao trazer até 80% da construção para fora do canteiro de obras, surge a oportunidade de realizar tarefas de forma concomitante, é o caso, por exemplo, das etapas de fundação e fabricação das estruturas.

Outra fonte de economia de tempo é o ganho de produtividade esperado em um ambiente fabril controlado, com processos industriais bem implementados e que não é afetado por variáveis comuns às construções tradicionais, tais como condições meteorológicas, mão de obra rotativa e diferentes logísticas de canteiro.

De forma geral, a construção offsite pode ser de 20% a 50% mais veloz que os métodos tradicionais. Esse ganho é especialmente benéfico para empreendimentos comerciais, industriais e residenciais focados no público investidor, pois permite a antecipação do recebimento de receitas.

Fonte: urbic.com.br

A Mora é uma das startups que busca se beneficiar disso. Eles desenvolvem pequenos apartamentos modulares para aluguel em regiões nobres de São Paulo e ao acelerar o prazo conseguem começar a receber os aluguéis mais cedo.

Por fim, o encurtamento do prazo também reduz o risco dos empreendimentos. Uma obra tradicional tem um ciclo construtivo de cerca de 4 à 5 anos. Quanto maior esse ciclo, maior a possibilidade do cenário macroeconômico se alterar durante a execução do projeto, impactando as vendas do empreendimento ou mesmo a chance do conceito pensado ficar obsoleto.

Segurança da mão de obra: as condições de trabalho na construção civil ainda são extenuantes, havendo o emprego de força excessiva para executar as diferentes atividades.

O setor continua com um índice de fatalidade elevado, de acordo com a Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, em 2017, o Brasil alcançou 5,21 mortes para cada 100 mil vínculos, enquanto na construção esse índice foi maior que o dobro da média nacional, alcançando a marca de 11,76 casos para cada 100 mil.

Todos esses fatores fazem com que o setor seja pouco atrativo para as gerações mais novas, inclusive, alguns países mais desenvolvidos já vem enfrentando esse problema.

Uma pesquisa feita nacionalmente com jovens dos EUA de 18 a 25 anos mostrou que 43% dos americanos não trabalhariam com construção independente do salário. A mesma pesquisa mostra que a atração de jovens é uma preocupação de pelo menos 63% das empresas.

Unidade de montagem Brasil ao Cubo

A construção offsite tem o potencial para agir sobre esses problemas por proporcionar um local mais controlado, mais seguro e que oferece condições de trabalho mais humanas, com reduzidos trabalhos em altura e um ambiente mais limpo.

Sustentabilidade: além da opção de usar materiais mais sustentáveis que o concreto, como é o caso da madeira, com a industrialização é possível reduzir o desperdício de materiais de cerca de 8% em construções tradicionais para até 1,8%.

A startup Noah utiliza essa vantagem como um diferencial de sua proposta de valor. A empresa tem como foco a construção de prédios corporativos e atua no segmento de healthy buildings, construindo seus empreendimento em madeira CLT, um material sustentável e estocador de carbono, buscando proporcionar ambientes que gerem bem estar e saúde aos usuários, além de mais produtividade e criatividade às equipes.

Fonte: noahtech.com.br

E a construção modular agora veio para ficar?

Quando analisamos a atratividade de algum mercado em relação a construção modular, dois fatores tem maior peso, são eles: uma alta demanda por casas e um alto custo da mão de obra especializada.

Projetando essas duas variáveis em um gráfico, conseguimos comparar diversos locais e identificar aqueles que um conjunto de características tornam-os propícios a adoção em massa dessa tecnologia.

Modular Construction: From Projects to Products - McKinsey Report

Olhando o gráfico acima, dois desses seriam o Reino Unido (“UK”) e o estado da Califórnia (contido dentro de “West”) nos Estados Unidos. Em ambos, temos uma combinação de uma alta demanda de casas - a Califórnia com um déficit habitacional de 500 mil casas por ano e o Reino Unido um déficit de 300 mil casas - e um alto custo da mão de obra especializada devido a essa alta demanda e a baixa atratividade do setor a força de trabalho mais jovem.

10 Startups de construção modular que mais levantaram capital privado

Por esses motivos, quando analisamos a tabela com as 10 startups de construção modular que mais levantaram capital privado, 7 delas estão no estado da Califórnia e 1 delas fica em Londres na Inglaterra.

E o Brasil?

Somos caracterizados por um alto déficit habitacional, com uma demanda anual de cerca de 1 milhão de moradias, mas a nossa mão de obra ainda é muito barata. A formalidade contratual, por exemplo, continua em níveis baixo, oscilando entre 50 a 70%.

Fonte: G1.com

Além disso, os impostos para a construção civil tradicional são reduzidos. Enquanto produtos industrializados pagam de 15 a 23% de IPI e ICMS, na construção, a incidência da tributação é concentrada sobre a mão de obra com alíquotas que vão de 2 a 5%, referentes ao ISS, ou seja, em termos de custos, a industrialização saí atrás.

Posicionando o Brasil no mesmo gráfico trazido anteriormente, observamos que ele se encontra em uma posição menos atrativa que os exemplos citados do Reino Unido e da Califórnia.

Modular Construction: From Projects to Products (alterada) - McKinsey Report

Entretanto, já temos casos de empresas no País que têm encontrado espaço de mercado ao utilizar modelos de negócios que exploram as principais vantagens desse método construtivo, como as mais conhecidas Tecverde e Brasil ao Cubo e startups em fases mais iniciais como as citadas ao longo do artigo.

Mas afinal, construção modular vai dar certo no Brasil?

Independentemente dos desafios para a construção industrializada, a verdade é que o setor tem apresentado uma queda de produtividade nas últimas décadas, de acordo com estudo da McKinsey, essa queda foi de - 1,21% ao ano entre 1995 - 2011.

Reinventing Construction: A route to higher productivity - McKinsey Report

Diante disso, uma parte da mudança necessária passa sim por adotar um número cada vez maior de componentes industrializados em nossas obras.

Modular Construction: From Projects to Products - McKinsey Report

A imagem acima mostra um panorama sobre a penetração do sistema modular em alguns países e podemos ver que na grande maioria ela ainda é bem incipiente, tendo maior destaque na Alemanha, Japão e nos países da Península Escandinava.

No Brasil, ainda não temos esses dados mas é certo que a porcentagem frente aos demais métodos construtivos é pequena. Num futuro próximo, não espero uma mudança radical nessa proporção mas vejo espaço para o avanço da metodologia.

Na minha visão, um grande impulsionador pode ser os imóveis para geração renda, já que passamos por um momento de procura por novos substitutos da renda fixa e a construção modular é muito interessante nesses casos por antecipar o recebimento de receita.

Aqui na Terracotta Ventures, temos apoiado iniciativas que busquem fomentar o amadurecimento desse mercado como o desafio de construção modular promovido pelo MITHUB, hub de inovação voltado à construção civil e mercado imobiliário.

Outro programa interessante que implantamos é o Mapa de Startups. Nele é possível encontrar todas as startups ativas do setor imobiliário e de construção do Brasil.

No futuro, esperamos que seja cada vez mais comum ver prédios inteiros sendo produzidos em fábricas e transportados até o canteiro para a montagem. Afinal, o aumento de produtividade é de extrema importância para o sucesso do País.

Kelvin Dechen - Startup Hunter